segunda-feira, 13 de agosto de 2012

UMA CARTA DE OSVALDÃO QUE CHEGOU AS MÃO DOS MILITARES

Prezado amigo... encontro-me na matas do Araguaia, de armas nas mãos, enfrentando soldados que pretendem me apanhar vivo ou morto. [...] Há mais de seis anos morava nessa região, dedicando-me, honesta e pacificamente, ao duro trabalho do garimpo ou do “marisco”. [...] Internei-me na mata, que conheço bem, para combater os inimigos do povo. Quero que o Pará e o Brasil sejam terras livres, onde todos possam trabalhar sem grileiros, sem perseguições policiais e contando com a ajuda de um novo governo, progressista e popular. [...] Peço-lhe que transmita a todo o revoltado, a todo inconformado com a situação de pobreza e falta de liberdade, a todo perseguido pelos poderosos e pela polícia, que será bem recebido pelos combatentes. Aqui, entre os revolucionários, ele poderá se refugiar e lutar. Sou um patriota, um filho do povo. Aspiro ardentemente livrar a nação do cativeiro, do domínio dos gringos norte-americanos e da ditadura. Osvaldo, de algum lugar do Araguaia. (Trecho do livro: MATA! O MAJOR CURIÓ E AS GUERRILHAS NO ARAGUAIA, página 146, de autoria de Leonencio Nossa). Será que houve grandes mudanças daquele período para o período atual? As terras do Pará são livres? Os grileiros deixaram de existir? Não há mais perseguições policiais? Os governos se tornaram progressistas e populares? O povo deixou de se revoltar e se inconformar com a situação de pobreza e a falta de liberdade? Os poderosos deixaram de perseguir os menos favorecidos? Sob a minha ótica, os problemas que a população enfrentava no período em que o guerrilheiro Osvaldão escreveu essa carta, permanecem até os dias atuais. Também não vejo muitas perspectivas de mudanças a curto e médio prazo. Penso que só acontecerão mudanças radicais se trilharmos o caminho da revolução.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Ruralistas dão motivos para Dilma vetar mudanças no Código Florestal

Rompendo acordo com governo, ruralistas lideram aprovação do Código Florestal na Câmara, ampliando retrocessos do texto elaborado no Senado. A presidenta Dilma ainda não se manifestou, mas possui uma lista de motivos para utilizar sua prerrogativa de veto: o rompimento do acordo por parte dos ruralistas, seus compromissos de campanha de não aprovar nada que aumente o desmatamento e promova a anistia de desmatadores e a pressão internacional às vésperas da Rio+20. A reportagem é de Vinicius Mansur. Vinicius Mansur Brasília - Por 274 votos a favor, 189 contrários e 2 abstenções, a Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (25), o relatório do deputado Paulo Piau (PMDB-MG) que modifica o Código Florestal, impondo sérios retrocessos à legislação ambiental brasileira. O resultado foi uma derrota para o governo federal que defendia a aprovação na íntegra do texto definido pelo Senado, no final do ano passado, ao qual considerava fruto de um acordo com os representantes do agronegócio no parlamento. Reiteradas falas do governo anunciaram que o texto dos senadores não era o ideal, mas o possível de ser alcançado pela mediação dos interesses presentes no Congresso Nacional. A bancada ruralista na Câmara, entretanto, manteve-se fiel apenas ao seu programa e incorporou mais de vinte alterações ao texto do Senado, que já representava um retrocesso na legislação ambiental para organizações sociais diversas, como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Via Campesina, ONGs como Greenpeace, SOS Mata Atlântica e Instituto Socioambiental, entre outras. A expectativa destas organizações é de que a presidenta Dilma Roussef vete as mudanças para proteger o Código Florestal. O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), disse na terça-feira (24) que a presidenta vetaria o texto, caso ele fosse aprovado com as alterações propostas por Piau. De tudo que foi apresentado pelo relator, apenas uma proposta não vingou. Mas, por força do regimento interno e não da vontade de Piau ou da maioria do plenário. A proposta que retirava a necessidade de recomposição de 15 metros da mata ciliar de rios com até 10 metros de largura foi recusada por se tratar de um texto já aprovado tanto pela Câmara quanto pelo Senado nos turnos anteriores de tramitação. A presidenta Dilma ainda não se manifestou, mas possui uma lista de motivos para utilizar sua prerrogativa de veto: o rompimento do acordo por parte dos ruralistas, seus compromissos de campanha de não aprovar nada que aumente o desmatamento e promova a anistia de desmatadores e a pressão internacional às vésperas da Rio+20. Gozando de popularidade recorde, tendo em mãos um projeto cuja antipatia da população é comprovada por pesquisas de opinião e contando com apoio de setores expressivos da imprensa, de movimentos e organizações sociais, da ciência e da religião, a presidenta tem um amplo ambiente favorável para enfrentar a decisão de numerosos deputados e o desgaste político que dele pode ser oriundo. Paulo Piau chegou a desafiar o governo no primeiro dia de votação. "Se vetar, nós derrubamos o veto", disse, acompanhado pelo líder do PMDB e futuro presidente da Câmara em 2013, Henrique Eduardo Alves (RN). A Constituição permite à Dilma vetar dispositivos - artigos, incisos ou alíneas – inteiros, e não partes deles, ou o texto completo. Para tal, ela terá 48 horas, contadas a partir do recebimento do projeto aprovado na Câmara, para comunicar o presidente do Congresso Nacional, o senador José Sarney (PMDB-AP), justificando as razões do veto. A decisão presidencial poderá ser derrubada pela maioria absoluta, metade mais um, de cada Casa, ou seja, por 257 deputados e 41 senadores. E aí reside o maior perigo para o governo em caso de veto. Na Câmara, os ruralistas comprovaram que sua proposta é majoritária. Restaria saber como se comportariam os senadores neste novo cenário. A apreciação de vetos presidenciais são realizadas por meio de voto secreto. Mudanças Entre as novas mudanças aprovadas no Código Florestal está a retirada da obrigação de divulgar na internet os dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro cartográfico dos imóveis rurais que facilita o monitoramento das produções agropecuárias e a fiscalização de desmatamentos. Assim como excluíram o artigo que exigia a adesão de produtores ao CAR em até cinco anos para o acesso ao crédito agrícola. O Ibama não poderá bloquear a emissão de documento de controle de origem da madeira de estados não integrados a um sistema nacional de dados. Os estados da Amazônia Legal com mais de 65% do território ocupado por unidades de conservação pública ou terras indígenas poderão diminuir a reserva legal em propriedades em até 50%. Foi derrubada a obrigatoriedade de recompor 30 metros de mata em torno de olhos nascentes de água nas áreas de preservação permanente ocupadas por atividades rurais consolidadas até 22 de julho de 2008. Foi retirada ainda do texto a regra de recomposição de vegetação nativa em imóveis de agricultura familiar e naqueles com até quatro módulos em torno de rios com mais de 10 metros de largura. Também foi retirada a definição de pousio, período sem uso do solo para sua recuperação, que permitia a interrupção de, no máximo, cinco anos de até 25% da área produtiva da propriedade. Com isso, áreas ilegalmente desmatadas há mais de uma década, mas hoje com florestas em recuperação serão automaticamente consideradas como produtivas e, assim, poderão ser legalmente desmatadas. Como também retirou-se o conceito de área abandonada, prejudica-se a reforma agrária, pois já não haverá terras subutilizadas por especuladores, mas apenas áreas “em descanso”. Também foi retirado do texto a necessidade de os planos diretores dos municípios, ou suas leis de uso do solo, observarem os limites gerais de áreas de preservação permanente (APPs) em torno de rios, lagos e outras formações sujeitas a proteção em áreas urbanas e regiões metropolitanas. Também foi aprovado o destaque que não considera apicuns e salgados como APP.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Rio+20 + mudança social

Texto sobre a Conferência Rio + 20. Vamos socializar o debate sobre a conferência.

Por Ricardo Abramovay
* Professor titular do Departamento de Economia da FEA, do Instituto de Relações Internacionais da USP, pesquisador do CNP e coordenador de Projeto Temático do Programa Fapesp de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais.

O desequilíbrio metabólico da atual relação entre a sociedade e os ecossistemas muda radicalmente a natureza, o alcance e o significado da questão da desigualdade no mundo contemporâneo. O principal desafio da Rio+20 não consiste em juntar economia verde e luta contra a pobreza. Essa junção já está em curso e faz parte do business as usual, da forma corriqueira de se levar adiante os negócios públicos e privados.

O desafio fundamental é associar a construção da economia verde ao combate à desigualdade. Além de seu óbvio fundamento ético e funcional, a luta contra a desigualdade adquire uma dimensão material inédita, da qual se podem citar dois exemplos vindos de importantes documentos internacionais recentes. O primeiro refere-se ao uso dos recursos materiais necessários à reprodução social. O International Resource Panel, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), publicou, há algumas semanas, o relatório Decoupling Natural Resource Use and Environmental Impacts from Economic Growth (Descasando o uso dos recursos naturais e os impactos ambientais do crescimento econômico). Esse descasamento exprime – juntamente com a promoção do uso sustentável da biodiversidade – a essência da economia verde, ou seja, a urgência de reduzir o consumo dos materiais e da energia que se encontram na base da riqueza social. Os resultados alcançados até aqui são, no mínimo, ambíguos. Por um lado, cada unidade de riqueza é oferecida ao mercado sobre a base do uso decrescente de materiais. Apesar desse avanço, entretanto, a extração de recursos da superfície terrestre cresceu oito vezes durante o século XX, atingindo um total de 60 bilhões de toneladas anuais, considerando-se apenas o peso físico de quatro elementos: minérios, materiais de construção, combustíveis fósseis e biomassa. Amplia-se o uso de recursos não bióticos e, com eles, a poluição e as emissões de gases de efeito estufa.

O descasamento entre a produção de riqueza e sua base material, mesmo em economias avançadas como o Japão e a Alemanha, foi apenas relativo, pois em termos absolutos a pressão sobre os recursos aumenta. Mas a informação que mais chama a atenção refere-se à desigualdade. Um indiano que nascer hoje consumirá ao longo de sua vida o correspondente a 4 toneladas de materiais anuais. Um canadense vai consumir 25. Achim Steiner, diretor-geral do Pnuma, que prefacia o relatório, preconiza que, nos próximos anos, o consumo médio global, num mundo com mais de 9 bilhões de habitantes, terá de cair das atuais 9 toneladas anuais per capita para algo entre 5 e 6 toneladas. A função da economia verde é estimular inovações que permitam a estas 5 ou 6 toneladas propiciar muito mais bem-estar e utilidades que as oferecidas hoje. Mas somente um mundo com recursos infinitos poderia manter este nível de desigualdade e, ao mesmo tempo, satisfazer as necessidades básicas dos que estão hoje em situação de pobreza.

O segundo exemplo, na mesma direção, vem do World Economic and Social Survey, do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais do Secretariado das Nações Unidas, e tem por título The Great Green Technological Transformation (A Grande Transformação Tecnológica Verde). O documento propõe que se estabeleça um limite para o consumo per capita de energia – 70 gigajoules por ano –, o que significaria cortar pela metade o gasto de energia do europeu médio e em três quartos o do americano. Já o indiano teria amplo espaço para aumentar seu consumo primário de energia, que hoje é, em média, de 15 gigajoules. Mas esse limite proposto refere-se à energia primária [1] e pode ser em grande parte compensado pela inovação, ou seja, pelo aumento na eficiência com que se usa a energia em todas as etapas anteriores à prestação dos serviços ou à produção dos bens e serviços a que se ela destina.

O grande desafio do século XXI, assim, está na construção de um metabolismo social capaz de garantir a permanência e a regeneração dos serviços que os ecossistemas prestam às sociedades. Mais precisamente, trata-se de chegar a um metabolismo industrial que reduza drasticamente o uso de carbono na base material e energética da sociedade e, ao mesmo tempo, ofereça oportunidades para que as necessidades básicas dos seres humanos sejam preenchidas. Sem objetivos claros na redução da desigualdade, é forte o risco de que a própria legitimidade da economia verde seja colocada em questão. É difícil imaginar tema mais importante para ocupar o centro da Rio+20.

[1] Aquela que está disponível na natureza em estado bruto, tal como carvão, petróleo, gás natural, urânio, ventos, recursos hídricos e energia solar.

sábado, 7 de abril de 2012

Recepção à primeira turma do Mestrado em Dinâmicas Territoriais e Sociedade na Amazônia

O Programa de Pós-Graduação em Dinâmicas Territoriais e Sociedade na Amazônia (PPGDTAM) promove, no dia 16 de abril próximo, como atividade de recepção á primeira turma de mestrado do programa, o Seminário " Dinâmicas Territoriais na Amazônia". Confira no Leia Mais a programação.


SEMINÁRIO "DINÂMICAS TERRITORIAIS E SOCIEDADE NA AMAZÔNIA"
DATA: 16/04/2012
Programação
MANHÃ
8h00 – Boas vindas à turma
Prof. Emmanuel Zagury Tourinho e Prof. Pedro Walfir - PROPESP
Profs. Hildete Pereira dos Anjos e Fernando Michelotti – CAMAR
Pra. Celia Regina Congilio - PPGDTAM
9h00 às 10h00 – CONFERÊNCIA
Dinâmica territorial e sociedade na Amazônia -Prof. Pierre Teisserenc –Paris 13/UFPA
10h00 às– 11h00 - Debates
11h00 às 12h30 - Apresentação do corpo docente e suas respectivas linhas de pesquisa
TARDE
15h00 às 16h00 – CONFERÊNCIA
Os dispositivos de regulação (Estado e Mercado) da indústria florestal na Amazônia - Prof. Marcelo Sampaio Carneiro - UFMA
16h00 às 17h30 - Debates
NOITE
Atividade Cultural
Música e coquetel no auditório do Campus I

Fonte: http://www.ufpa.br/campusmaraba
PROJETO DE TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

AUTOR
Valtey Martins de Souza

TEMA
MULHERES QUEBRADEIRAS DE COCO, CIDADANIA E DESENVOLVIMENTO LOCAL EM SÃO DOMINGOS DO ARAGUAIA-PA.

JUSTIFICATIVA

Esse projeto de estudo se justifica pela necessidade de entender o processo de desenvolvimento da atividade extrativa do babaçu (Orbignyaphalerata) local, a influência dessa atividade na economia regional e o modo como o meio ambiente é visto pelos diferentes atores locais. Para tal entendimento, penso que os direitos e deveres dessas mulheres devam ser mais bem analisados, pois, me parece que elas não desfrutam de cidadania plena.

OBJETIVO GERAL

Compreender o processo de extração e comercialização do babaçu (Orbignyaphalerata) pelas mulheres quebradeiras de coco do município de São Domingos do Araguaia, Pará.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

- Entender o processo extrativo do babaçu;
-Verificar a quantidade de pessoas envolvidas nesse processo;
- Fazer uma análise sobre a cidadania das quebradeiras de coco;
- Compreender como se dá a influencia dessa atividade extrativa na economia regional;
- Analisar a influencia do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), no modo como as pessoas se relacionam com o meio ambiente;
- Cartografar o MIQCB no município em questão.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para realizar este trabalho,pretendo fazer pesquisa bibliográfica e de campo. Para abranger essa última irei realizar entrevistas (estruturadas e semiestruturadas); questionários; observação direta; e análise documental, principalmente as políticas públicas locais. Nas entrevistas e questionários deverão estar permeado com questões a respeito do modo como o coco babaçu (Orbignyaphalerata) é extraído, beneficiado e comercializado; o tempo gasto nessas atividades; as questões que impedem ou dificultam suas atividades; o modo pelo qual as quebradeiras se relacionam com o ambiente; a abrangência espacial do MIQCB (Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu); dentre outras. A análise documental deve se dá, principalmente, no exame do Plano Diretor Participativo do município em questão.
Dessa maneira, na revisão bibliográfica irei discutir vários conceitos, dentre eles o de Floresta Amazônica (KITAMURA, 2001); povos tradicionais (SATO; SANTOS, 2003);MIQCB (MIQCB, 2005);desenvolvimento sustentável local (BUARQUE, 2002);cidadania (BURNHAM, 2003).
Assim, na revisão bibliográfica, começarei utilizando conhecimentos de autores como Kitamura (2001), que ao falar de Floresta Amazônica, nos mostra como as comunidades locais a percebem. Para ele, essas comunidades locais percebem a Floresta Amazônica como reguladora do equilíbrio dos ecossistemas em que vivem e como rede de sua subsistência, pois fornece produtos e serviços para seus cotidianos.
Nessa perspectiva, esse autor entende que o valor de uso da Floresta é imediatamente palpável no dia-a-dia dos “povos da Floresta”, especialmente porque grande parte de sua subsistência é oriunda do meio natural, notadamente a alimentação, que vem da coleta de produtos da Floresta, da caça e da pesca.
Na sequência falarei das mulheres quebradeiras de coco (Orbignyaphalerata). Ao analisar Almeida (1995), desvendei que a coleta de produtos da floresta, em especial o coco babaçu, é feita principalmente por mulheres e crianças. Segundo esse autor, o extrativismo praticado pelas catadeiras não se enquadra como atividade principal das famílias, que na maioria das vezes cuidam de pequenos roçados.
Nesses termos, entendo que as mulheres catadeiras de coco babaçu são parte integrante da comunidade local, e mantem costumes dos “povos da Floresta”,sobretudo porque parte de sua subsistência tem origem no meio natural. Os povos da floresta algumas vezes são chamados de povos tradicionais, que sob o escopo de Arruda, analisado por Sato e Santos (2003), considera que algumas populações eram assim nomeadas porque não faziam parte do elo dos núcleos dinâmicos da economia nacional, e também porque adotaram o modelo biorregional, refugiando-se nos espaços menos povoados, onde a terra e os recursos naturais ainda eram abundantes, permitindo sua sobrevivência e a representação desse modelo cultural conexo com a natureza, com inúmeras variantes locais determinados pela especificidade ambiental e histórica da comunidade.
Visto sob essas condições, percebo que as atividades extrativas do coco babaçu desenvolvidas por essas mulheres contribuem para um desenvolvimento sustentável local, especialmente porque se busca a conservação ambiental, o crescimento econômico e a equidade social, como prega Buarque (2002) ao falar desse modelo de desenvolvimento.
Dessa forma, percebo que as mencionadas atividades realizadas por essas mulheres devem contribuir para o desenvolvimento local, que na percepção do autor citado no parágrafo anterior, pode ser conceituado como um processo endógeno de mudança, que leva ao dinamismo econômico e o progresso da qualidade de vida da população em pequenas unidades territoriais e aglomerações humanas. Na concepção desse autor, para o desenvolvimento local ser sustentável e consistente, deve mobilizar e explorar as potencialidades locais e contribuir para elevar as chances sociais e a viabilidade e rivalidade da economia local; ao mesmo tempo, a conservação dos recursos naturais deve ser assegurada, visto que são a base mesma de suas potencialidades e condições para a qualidade de vida da população local.
Segundo Buarque (2002), essa iniciativa endógena demanda, normalmente, um movimento de preparo da sociedade local, cultivando suas habilidades e potencialidades próprias, de modo a criar raízes essenciais da matriz socioeconômica e cultural da localidade.
Nesse contexto, percebo que o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), se constitui em importante elemento de luta das mulheres quebradeiras de coco babaçu local, pois segundo oMIQCB (2005),esse movimento se estabeleceu a partir de um trabalho conjunto que envolveu uma rede de organizações voluntárias tais como: associações, clubes, comissões, grupos de mulheres e cooperativas que apresentam como bandeira de luta, a preservação dos babaçuais, a garantia do acesso a terra, a formulação de políticas governamentais voltadas para o extrativismo, o livre acesso aos babaçuais e a igualdade de gênero.
Nesses termos, notei que as mulheres participantes do MIQCB não exercem os direitos básicos de sobrevivência na sua plenitude, pois às vezes são impedidas de extrair o coco babaçu em terras particulares. Assim, suas cidadanias são afetadas, porém, para lutarem por seus direitos fundamentais essas mulheres se organizam em movimentos como o MIQCB. Em organizações como essas, as participantes podem chegar ao “estado” decidadão-trabalhador-autor-crítico-instituinte, como prega Burnham (2006).Para essa autora, nesse “estado” de cidadão, o mesmo reflete, se autoriza, reconhece os pares e, desse modo, é propositor, (re)construtor, (re)instituinte de esferas da vida política-sócio-cultural-ambiental, articulador coletivo, radiculado em sua comunidade/cultura local e também com participação em procedimentos formadores de modificações profundas, globais.
Sob essas condições, verifiquei ainda, que além dos proprietários de terras não permitirem que as mulheres quebradeiras de coco babaçu tenham acesso aos babaçuais, desmatam sem licença ambiental para isso. Assim, esses proprietários estão desrespeitando um dos princípios fundamentais do Direito Ambiental, que é o princípio da função socioambiental da propriedade. Segundo Leite e Pilati (2011), esse princípio é contemplado pelo ordenamento jurídico brasileiro no art. 1.228, parágrafo único, do Código Civil. Esses autores fazem a seguinte leitura do mencionado parágrafo:
O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas (p. 23).
Nessa conjuntura, os autores acima citados entendem que aqueles que provocam danos ambientais devam ser responsabilizados. Ao falarem de responsabilidade civil ambiental, eles entendem responsabilidade civil como a obrigação de reparar danos acarretados a pessoas, ao patrimônio, ou a interesses coletivos ou transindividuais, sejam eles difusos ou coletivos stricto sensu.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, A. W. B. de. Quebradeiras de Côco Babaçu: Identidade e Mobilização. São Luís: III Encontro Interestadual das Quebradeiras de Côco Babaçu: 1995.
BUARQUE, Sergio C. Construindo o desenvolvimento local sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2002.
BURNHAM, Teresinha Fróes. Pesquisa multirreferencial em educação ambiental: bases sócio-culturais-político-epistemológicas. Pesq. Educ. Ambient. [online]. 2006, vol.1, n.1, pp. 73-92. ISSN 1980-1165.
LEITE, J. R. M; PILATI, L. C. Princípios fundamentais do direito Ambiental. In: PILATI, L. C; DANTAS, M. B. Direito ambiental simplificado. São Paulo: Saraiva, 2011. – (Coordenador José Rubens Morato Leite).
_______. Responsabilidade Civil Ambiental. In: PILATI, L. C; DANTAS, M. B. Direito ambiental simplificado. São Paulo: Saraiva, 2011. – (Coordenador José Rubens Morato Leite).
KITAMURA, Paulo Choji. Amazônia: produtos e serviços naturais e as perspectivas para o desenvolvimento sustentável regional. In: ROMEIRO, A. R; REYDON, B. P; LEONARDI, M. L. A. (Org.). Economia do meio ambiente: teoria, politicas e a gestão de espaços regionais.- Campinas, SP: Unicamp. IE, 2001.
MOVIMENTO INTERESTADUAL DAS QUEBRADEIRAS DE COCO. Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia. São Luís, 2005. (Quebradeiras de Coco Babaçu – Pará, Fascículo 5).
SÃO DOMINGOS DO ARAGUAIA-PA. Lei n.º 1.159/2006 de 2 de outubro de 2006. Dispõe sobre o Plano Diretor Participativo do Município de São Domingos do Araguaia.
SATO, Michèle; SANTOS, José Eduardo. Tendências nas pesquisas em educação ambiental. In: NOAL, F.; BARCELOS, V. (Orgs.). Educação ambiental e cidadania: cenários brasileiros. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2003. p. 253-283.


*Trabalho apresentado em setembro de 2011 ao Professor José Pedro, da disciplina Atividades Programadas para a Preparação de Monografias, do curso de Especialização em Educação Ambiental, Cidadania e Desenvolvimento Regional, do Núcleo de Educação Ambiental da UFPA, Campus Sul e Sudeste do Pará, Marabá.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

PARABÉNS

Os meus PARABÉNS ao Valteir e ao Renato pela conquista na prova de Mestrado. Essa é mais uma prova que a turma de Educação Ambiental tem um grande potencial. Marcus

quinta-feira, 22 de março de 2012

POLÊMICA SOBRE O NOVO PCCR DOS EDUCADORES DE PARAUAPEBAS

OS EDUCADORES DE PARAUAPEBAS NÃO ABREM MÃO
DA APROVAÇÃO DO NOVO PCCR CONSTRUIDO PELA CATEGORIA

Há quatro anos a categoria vem construindo o novo Plano de Cargos, Carreira e Remuneração da rede municipal de ensino. A greve municipal de 2010 foi resultado da falta de um PCCR que realmente valorize e contemple todos os educadores de Parauapebas.

Por isso o nosso primeiro ponto de pauta na greve era a aprovação do NOVO PCCR da categoria. De lá para cá obtivemos muitas conquistas e abrimos mão de outras. Destacamos as horas atividades, que ganhamos em primeira instância na justiça e abrimos mão do montante total, em função do nosso PCCR. Vale ressaltar que a hora atividade era um direito constitucional dos professores e o governo não pagava há quase uma década. Só passou a pagar a partir do ano passado, depois da greve.

Todavia, até o momento o governo continua nos enrolando com relação ao PCCR. Foi nomeada uma comissão pelo governo que nunca trabalhou de forma unificada e que não tem autonomia para decidir o encaminhamento dos pontos conflitantes do PCCR, que são: gratificações por nível de escolaridade, concurso público para especialista em educação, criação do cargo de educador ambiental, licença remunerada para estudos e eleição direta para diretores de escolas.

Esse governo que se diz ser cidadão, democrático e dos trabalhadores, parece não querer promover a autonomia das escolas públicas. Assim como os outros governos passados, continua usando as escolas como “currais eleitorais”, fazendo dos cargos públicos, instrumento de negociação partidária ou de coação para a manutenção do poder conservador e indolente.

Por último não quer respeitar a legitimidade da greve nacional da educação de três dias, convocada pela CNTE e coordenada em nosso município pelo SINTEPP. Lembramos ao governo que este movimento foi em prol dos 10% do PIB para a educação, o que garantiria o cumprimento imediato do piso salarial pela maioria dos governos municipais e estaduais, como também a melhoria significativa do ensino público.

Portanto, estamos contribuindo para que aumentem os investimentos em educação, que beneficiará todos os prefeitos, mesmo aqueles que estão se colocando contra a luta da categoria. Os chefes desse governo, que é formado quase todo por professores também se beneficiarão com o novo PCCR.

Por coerência, o “governo cidadão” deveria apoiar o movimento dos educadores, visto a importância que já teve esse movimento para ampliar os investimentos públicos na educação de nosso município, principalmente na melhoria salarial de todos os educadores, inclusive os que ocupam cargos de coordenadores e diretores de escolas. Será se não tivesse acontecido à greve em 2010 nós teríamos hoje as quadras cobertas, as escolas reformadas e climatizadas, a entrega dos notebooks, a melhoria da merenda escolar e o pagamento das horas atividades?

Esperamos mais uma vez que o governo não inviabilize a aprovação do novo PCCR e não cause mais transtornos para a educação, pois só temos até a primeira semana de abril para que o PCCR seja aprovado pelos vereadores, caso contrário todas as nossas negociações aconteceram em vão e o SINTEPP terá toda a razão do mundo para encaminhar a decisão da categoria que é o NOVO PCCR aprovado ou GREVE MUNICIPAL.

Raimundo Moura, Pedagogo, Especialista em Educação Ambiental, Cidadania e Desenvolvimento Regional pela UFPA, educador da rede municipal e estadual de ensino, membro do Conselho Municipal de Educação de Parauapebas e da Comissão do PCCR.

quarta-feira, 21 de março de 2012

VAMOS SOCIALIZAR O RESUMO DOS ARTIGOS FINAIS DO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL, CIDADANIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL


ARTE E EDUCAÇÃO AMBIENTAL: O Currículo e a Prática Pedagógica do Ensino de Arte no 3º e 4º Ciclos do Ensino Fundamental na Escola Novo Horizonte
Maria Geneuci da Silva Santos
Universidade Federal do Pará (UFPA) - Campos de Marabá/Pa
mariageneucidasilvasantos @yahoo.com.br

RESUMO
Este artigo é resultado de uma pesquisa de campo realizada sobre o tema Arte e Educação Ambiental, a qual analisou a Proposta Curricular para o ensino de arte no 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental desenvolvida na Escola Municipal Novo Horizonte, bem como a relação desse currículo de artes com a E.A através da prática pedagógica dos educadores dessa modalidade de ensino.  A fim de refletir sobre os procedimentos didático-pedagógicos desenvolvidos em sala de aula que viabilizem a emancipação dos sujeitos envolvidos. Os argumentos aqui apresentados giram em torno da premissa de que as transformações dos valores éticos e estéticos modificam atitudes e comportamentos nas relações dos sujeitos com o meio ambiente. A análise feita permitiu compreender como o ensino da arte se distancia da E.A. Para tanto a pesquisa tem como fundamentos teóricos abordagem sobre a importância da educação ambiental, da história da arte e os valores sociais. Tendo como foco, o currículo escolar em arte e tema transversal a E. A e suas implicações culturais. Além de ter como foco de análise o Plano Municipal de Educação, tomando como referência o Parâmetro Curricular Nacional para o Ensino de Arte e a Proposta Curricular Municipal para o Ensino de Arte nos 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental. Como técnica de coleta de dados in loco fez-se observações das atividades do educador de Arte em sala de aula. Finaliza com a apresentação de algumas considerações para a reflexão acerca da mudança paradigmática do pensamento ocidental em direção ao pensamento sistêmico e seus benefícios à educação e à sustentabilidade.
 
Palavras-Chave: Educação Ambiental, Ensino de Artes, Transdisciplinaridade, Sustentabilidade.

domingo, 11 de março de 2012

Cavernas, lagos e cifrões


Por Lúcio Flávio Pinto | Cartas da Amazônia – qua, 8 de fev de 2012
 
Em 1967, um pequeno grupo de geólogos, contratados por aquela que era então a maior siderúrgica do mundo, a United States Steel, confirmou em pesquisa de campo: 500 quilômetros ao sul de Belém, a 900 quilômetros do litoral norte, em plena selva amazônica, havia a melhor jazida de minério de ferro do planeta.
Carajás era um paraíso. O minério mais usado pelo homem aflorava no alto dos platôs cobertos por vegetação rasteira, em altitudes que chegavam a 600 metros. As encostas eram tomadas, em grande densidade, por árvores altas, que se espraiavam por todas as direções. Circundando as serras, dois rios serpenteavam suas águas. A fauna era rica, exuberante. Aquele lugar merecia servir de imagem para o Éden.
Minério e natureza selvagem são termos acompanhantes — e também conflitantes. A extração de um é feita à custa da integridade da outra. Mas nunca esse choque foi tão forte quanto em Carajás.
Originalmente, esse enorme depósito de ferro devia ser levado para os Estados Unidos. Mas quando a US Steel se retirou do empreendimento, em 1977, a estatal Companhia Vale do Rio Doce, que sucedeu a multinacional americana, desviou o rumo para o Oriente. A hematita do Pará atravessaria 20 mil quilômetros de mares e iria preferencialmente para o Japão, até então abastecido pela Austrália, que estava quatro vezes mais próxima.
Ao chegarem a Carajás, os japoneses se deslumbravam. Diga-se que não era apenas pelo fato de que o teor de hematita na rocha daquela região possuía o dobro da qualidade do similar australiano. Era também porque a rica paisagem contrastava com a aridez das zonas mineiras tradicionais. Ambiente igual não existia. Só em Carajás.
Em 2007 a Vale, privatizada 10 anos antes, comemorou o primeiro bilhão de toneladas produzidas em Carajás. Dava a média de 45 milhões de toneladas por ano. Nos primeiros anos após a inauguração da mina, em 1984, a produção não fora além de 25 milhões de toneladas, que era a meta do projeto. Nos anos mediatamente anteriores ao 1º bilhão, a produção era de 90 milhões de toneladas.
Neste ano já devia passar para 130 milhões, mais de um terço de toda a produção da Vale, que é a segunda maior mineradora do mundo (depois da anglo-australiana BHP Billiton) e a maior vendedora de minério de ferro. Mas desde 2006 a produção não cresce, derrubando as metas fixadas pela empresa.
Era porque a Vale não conseguia liberar seus novos projetos em Carajás. Só no final do mês passado, depois de 10 anos sem expedir qualquer documento para a companhia, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis aprovou o licenciamento ambiental para o funcionamento da quinta mina na parte norte da jazida.
O ato foi muito comemorado, mas dele não resultará qualquer
modificação na escala da extração. Melhorará apenas a qualidade da mercadoria, já que a mina liberada contém minério de melhor teor do que o das minas já em exploração.
Para a Vale, o mais importante é se essa aprovação indicar a tendência do Ibama de repetir o licenciamento, talvez ainda neste ano, de uma nova área de mineração, ao sul das minas que estão em atividade há quase 40 anos. A Serra Sul tem mais e melhor minério. Por isso proporcionará à Vale dobrar a atual produção. Mas também é uma paisagem ainda mais deslumbrante e rara.
No conjunto de serras do sul do distrito mineral há um belo e profundo lago perene. Há várias cavernas, nas quais o homem viveu, a partir alguns milhares de anos atrás. São testemunhos arqueológicos valiosos.
Um antigo gerente de Carajás quis dinamitar cavernas da Serra Norte, que abriram um novo capítulo para a reconstrução da presença humana na Amazônia. Foi contido.
Desde então, cavernas têm que permanecer intocadas em áreas de mineração. Se assim continuar, Serra Sul não poderá existir. Mas ela é um projeto de oito bilhões de dólares (10% previstos para 2012). Ao preço de hoje, permitiria à Vale faturar mais do que US$ 10 bilhões por ano, mandando 60% de toda a sua produção para a China.
São quantidades de causar impacto, como vem acontecendo em Carajás desde 2001, quando os chineses, que até então eram um cliente de pouca significação (compravam 5% do minério da Vale), começaram a avançar sobre as montanhas de minério rico. Suplantaram seus vizinhos japoneses e agora pesam nos destinos da Vale — e do Brasil — como, talvez, nenhum outro país em toda a história nacional.
Graças a isso, no ano passado o lucro líquido da Vale representou quase 10 vezes mais do que os US$ 3,3 bilhões pagos ao governo pelo controle acionário da estatal, a jóia da coroa das privatizações realizadas a partir do governo Collor (e só na aparência interrompidas pela administração do PT, aparência desfeita de vez pela alienação de três aeroportos até então oficiais).
Quase metade dos US$ 30 bilhões de lucro de 2011 serão investidos pela Vale neste ano. O principal empreendimento é o de Serra Sul, que praticamente recomeça a história de Carajás e dá um salto (talvez mortal) nas transações com a China. Cavernas e lago terão vez nessa agenda de cifrões?

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Fórum Social: O que João Pedro Stedile disse a Dilma em Porto Alegre

Durante o encontro de Dilma Rousseff com representantes do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial, o dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) questionou a presidenta sobre a agenda ambiental do governo, em especial sobre o Código Florestal, a agricultura familiar, a agroecologia e a Amazônia. "Para nós não há possibilidade de desenvolvimento sustentável sem redução da desigualdade social", reafirmou Dilma.
Verena Glass - Repórter Brasil
Transcrição da fala de João Pedro Stedile, do MST, na reunião entre Dilma e representantes da sociedade civil, realizada em 26 de janeiro de 2012, durante o Fórum Social Temático em Porto Alegre:

“Quero começar, em nome dos movimentos sociais do campo, a cumprimentar a nossa presidenta por ter escolhido Porto Alegre e não Davos. A senhora parece ser realmente corajosa. Mas a minha obrigação aqui, em nome dos movimentos sociais do campo – sem querer representar a todos –, é trazer algumas idéias nesse espírito do diálogo aberto e franco.

Prometo não falar de reforma agrária, porque ela está paralisada, apesar de termos ainda 180 mil famílias acampadas nas beiras das estradas que precisam pelo menos de uma solução humanitária. Mas como o tema aqui é Rio + 20, nós analisamos no MST, com tudo que aprendemos na tradição de luta socialista e cristã, que a melhor pregação é o exemplo. Que o Brasil só pode liderar um processo internacional de defesa do nosso planeta, da nossa biodiversidade, se nós dermos o exemplo.

Nós temos uma agenda nacional que precisa ser resolvida. A primeira delas é que não podemos admitir as mudanças que foram acordadas no Senado para o Código Florestal. Vamos descobrir seu correio eletrônico para que o povo brasileiro lhe escreva para pedir o veto de alguns artigos que a senhora mesmo se comprometeu [a vetar] durante a campanha, e que nós não podemos aceitas.

Nós não podemos aceitar a anistia dos crimes ambientais dos latifundiários, assim como não aceitamos a redução da reserva legal, mesmo nos quatro módulos. Porque isso abre brecha para o capital internacional seguir desmatando o Cerrado e a Amazônia. A nossa política – esperamos que a senhora concorde – é do desmatamento zero. Não há necessidade de derrubarmos mais nenhuma árvore para seguirmos aumentando a produção de alimentos, inclusive em condições muito melhores.

A segunda agenda: nós precisamos fazer um grande programa nacional de reflorestamento para a agricultura familiar, controlado pelas mulheres – já que as mulheres agora mandam nesse país -, um programa para que cada agricultor familiar possa reflorestar dois hectares. Isso é uma merreca. O BNDES dá tanto dinheiro para multinacional, chegou até a financiar a America Online, massa falida… Por que não pode dar dinheiro para a agricultura familiar reflorestar o nosso país, que é uma contribuição para a humanidade?

Terceira agenda: nós precisamos com urgência um programa nacional que estimule a agroecologia. Um programa de políticas públicas que recupere uma agricultura sadia, que plante alimentos sem veneno. Quanto mais agrotóxico colocarmos nos alimentos, maior a incidência de câncer. É uma obrigação nossa produzir alimentos sadios, e para isso as técnicas da agroecologia são as mais recomendadas. Mas o governo está ausente, e é preciso ter políticas públicas que compensem e estimulem [estas práticas].

Quarta agenda: o Ministério da Integração Nacional anunciou que vai irrigar 200 mil hectares do Nordeste. Ótima noticia. Mas aí vai para lá a Cutrale, empresários do Sul, isso é uma vergonha, presidenta. Nós apelamos, em nome dos nordestinos, nós precisamos distribuir esses 200 mil ha para fazer assentamentos. Dois hectares por família, a senhora vai assentar 100 mil agricultores do Nordeste, que vão ficar juntinhos da água, e resolve três problemas: do alimento, da água e do emprego. Não precisa levar empresários do Sul. Senão vamos ocupar as terras deles.

Quinta agenda: nós não podemos nos conformar que governos do exterior deram 700 milhões para o Fundo Amazônia, e o dinheiro está lá parado no BNDES, e pela burocracia do banco só 10% do dinheiro foi aplicado. E ainda assim, dos 23 projetos, a maioria é de governos da Amazônia, de Rondônia, do Amapá. Ora, a vocação deste dinheiro é para recuperar a Amazônia, são projetos sociais, não é para governo. Governo tem outros mecanismos.

Por último, nós não podemos fazer uma conferência de meio ambiente e os nossos irmãos guarani-kaiowa continuam morrendo. Isso é uma dívida de honra. Nós não podemos aceitar que o agronegócio continue matando os povos indígenas que são os verdadeiros zeladores da nossa biodiversidade e do território. Então se a senhora só resolver os problemas dos guarani-kaiowá no Mato Grosso do Sul já vai para o céu. Agora, se não resolver isso, não adianta falar em biodiversidade, assinar documento. E a mesma coisa com as comunidades quilombolas. Faz dois anos que o Incra não legaliza nenhuma área quilombola. É a maior dívida social que nós temos, o país foi construído com trabalho escravo, e agora não consegue reconhecer uma área? Nós temos que recuperar a legalização das terras quilombolas.”

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Vale vence prêmio de pior empresa do mundo

A transnacional brasileira Vale conquistou o primeiro lugar no 'Nobel' da vergonha corporativa no Public Eye Awards, que elege por voto popular a pior empresa do mundo em questões ambientais, sociais e trabalhistas. O prêmio foi criado pelo Greenpeace Suíça e Declaração de Berna e o vencedor é sempre revelado durante o Fórum Econômico Mundial, aberto nesta semana em Davos, na Suíça.
A Vale disputou o primeiro lugar com a japonesa Tepco, envolvida no desastre nuclear de Fukushima, mas superou a usina com um total de 25.041 votos. Para as entidades que indicaram a Vale ao prêmio - a Articulação Internacional dos Atingidos pela Vale, representada no Brasil pela Rede Justiça nos Trilhos, e as ONGs Amazon Watch e Xingu Vivo para Sempre -, o fato de a Vale ser uma multinacional presente em 38 países e com impactos espalhados pelo mundo, ampliou o número de votantes.
Para os organizadora do Public Eye, um fator determinante para a entrada da Vale na disputa entre as piores foi a adesão em 2010 no Consórcio Norte Energia, que constrói a usina de Belo Monte, no Rio Xingu.
“Para as milhares de pessoas, no Brasil e no mundo, que sofrem com os desmandos desta multinacional, que foram desalojadas, perderam casas e terras, que tiveram amigos e parentes mortos nos trilhos da ferrovia Carajás, que sofreram perseguição política, que foram ameaçadas por capangas e pistoleiros, que ficaram doentes, tiveram filhos e filhas explorados, foram demitidas, sofrem com péssimas condições de trabalho e remuneração e tantos outros impactos, conceder à Vale o título de pior corporação do mundo é muito mais que vencer um prêmio. É a chance de expor aos olhos do planeta seus sofrimentos e trazer centenas de novos atores e forças para a luta pelos seus direitos e contra os desmandos cometidos pela empresa”, afirmaram representantes das entidades que encabeçaram a campanha contra a mineradora.
As demais vencedoras foram a Tepco (24.245 votos), Samsung (19.014 votos), Barclays (11.107), Syngenta (6.052) e Freeport (3.308), empresa que atua na Papua e é acusada de torturar e matar os que levantam suas vozes contra seus abusos.
Com informações do Movimento Xingu Vivo para Sempre e Public Eye Awards

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Pouco se falou de um outro  relatório, divulgado no mesmo dia em Davos pela organização Amigos da Terra, que traz mais informações sobre a atuação da empresa. O documento tem oito páginas, mas aqui vai um resumo das principais informações:
- Em 2008, a Vale declarou sua intenção de reduzir suas emissões de carbono. Ao invés disso, em 2010, emitiu 20 milhões de toneladas de CO², um aumento de um terço em relação aos níveis de 2007 (de 15 milhões de toneladas de CO²).
- Segundo o relatório, a empresa conta com representantes na delegação oficial do governo para as Nações Unidas e é uma das empresas que têm exercido pressão para minar (perdão pelo trocadilho) políticas globais de combate ao aquecimento global.
- O texto menciona também a Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA), no Rio de Janeiro. Segundo a Amigos da Terra, a atividade no complexo de produção de aço elevou as emissões do estado em 76%. “O projeto comprometeu severamente o sustento de oito mil pescadores da baía de Sepetiba e a companhia foi denunciada por crimes ambientais”, disse Lucia Ortiz, da Amigos da Terra Internacional.

- No caso da mina de carvão Moatize, em Moçambique, a mineradora brasileira é criticada por ter realocado 1.300 famílias em áreas com difícil acesso à água, energia e terras aráveis, em casas em mau estado de conservação. A mina de Moatize começou a ser explorada no ano passado e é considerada uma das maiores reservas de carvão do mundo. “Membros das comunidades locais foram ameaçados e perseguidos e estes relatos são apenas a ponta do iceberg”, afirmou Daniel Ribeiro, do escritório local da organização Amigos da Terra.
Para rebater o troféu indesejado e as informações da Amigos da Terra, a Vale criou uma página na internet. Nela, a empresa afirma que, ciente de que a atividade mineradora gera impacto, a empresa “atua de forma a controlá-los e reduzi-los”.
Também divulgou que investirá, este ano, a quantia de US$ 1,65 bilhão em ações socioambientais.
No site, podem ser encontradas informações correspondentes a algumas das críticas feitas no relatório da Amigos da Terra. Outras, porém, como a relacionada ao empreendimento no Rio de Janeiro, ficam sem resposta. A assessoria de imprensa da Vale afirmou que a empresa não se manifestará sobre o relatório.

Clarice Couto é editora-assistente de Época NEGÓCIOS

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Vale duplica ferrovia e multiplica violações no Maranhão e Pará

Revista Caros Amigos - Edição dezembro/2011

Em reportagem especial, a jornalista Tatiana Merlino retrata os danos ambientais e sociais causados pela mineradora VALE, nos estados do Maranhão e do Pará. Privatizada em 1997, a ex-estatal Companhia Vale do Rio Doce deu um salto no mundo privado e é hoje uma das maiores do mundo – graças principalmente à voracidade com que tem sugado os recursos naturais do Brasil para abastecer os mercados internacionais.
A VALE é tão importante para estados e municípios que a grande maioria das autoridades fecha os olhos diante dos danos causados pela empresa, não apenas a super-exploração dos minérios,mas também o desprezo com que trata pessoas e cidades que se encontram no seu caminho. É o que acontece com a duplicação da ferrovia da VALE – cujo projeto tem provocado as mais bárbaras violações dos direitos sociais e humanos.

Trecho extraído da matéria:

Lucinete* aproxima-se de um homem sentado em uma cadeira de plástico, que, acompanhado de uma jovem, toma cerveja.
– Oi, tudo bem? Você não me ligou... Por quê? – questiona ela.
Não é possível ouvir a resposta.
“Combinamos de ele me ligar amanhã ao meiodia para a gente sair”, conta Lucinete ao voltar, sorrindo. O homem aparenta ter entre 50 e 55 anos, e, embora esteja com uma moça ao seu lado, a quem acaricia e beija, lança muitos olhares para o corpo de Lucinete. A adolescente de 16 anos veste uma calça jeans justa, mini-blusa vermelha, também colada ao corpo, batom vermelho e pintura forte nos olhos.
Como Lucinete, várias outras meninas circulam pelo local, numa noite de sábado do mês de outubro. O figurino é o mesmo: roupinhas justas, curtas, brilhantes, maquiagem no rosto, salto alto, unhas pintadas, cabelo arrumado. A casa de baile de Bom Jesus das Selvas, município localizado no oeste do Maranhão, é o ponto de encontro da cidade, a balada onde jovens, e nem tão jovens, encontram-se para beber, dançar e confraternizar. É ali que também ocorrem os encontros de meninas pobres da cidade com os funcionários das empresas que chegaram a partir de 2010, entre elas a Norberto Odebrecht. Na cidade, a construtora instalou um de seus canteiros de obras para a duplicação de 605 dos 892 quilômetros da Estrada de Ferro Carajás (EFC), concessionária da transnacional mineradora Vale (os quilômetros restantes já foram duplicados e hoje servem de pátios de cruzamento).
A duplicação faz parte de um pacote de cerca de 7,8 bilhões de dólares até 2014 e atenderá o maior projeto da história da empresa e também o maior da indústria de minério de ferro do mundo: o S11D, que será implantado na Serra Sul de Carajás, em Canaã dos Carajás, Pará.
Para atender à iniciativa, a mineradora também construirá um ramal ferroviário de 100 quilômetros ligando a mina de Canaã dos Carajás à EFC, em Parauapebas, e um quarto píer no Terminal Marítimo de Ponta da Madeira, na capital São Luís, no litoral maranhense. O projeto aumentará a capacidade de produção de minério dos atuais 100 milhões de toneladas ao ano, em 2010 para 230 milhões, em 2015.
Tal aporte pode ser explicado pela pesquisa da Global Industry Analysts (GIA), que aponta que até 2015 o consumo mundial de minério de ferro deve atingir 1,7 bilhão de toneladas ao ano, aumento de 70% em relação a 2010. O aumento no consumo é impulsionado pelo crescimento da economia de países emergentes, em especial a China.