Valtey Martins de Souza
Izabel Maria
Marcus Vinícius
Nilvânia Carvalho
Raimundo Moura
Renato Noronha Martins
Simone Cunha
O presente trabalho visa discorrer sobre a legislação ambiental que trata da conservação das florestas no país, o Código Florestal, na perspectiva de realizar uma análise crítica sobre as propostas de mudanças do projeto do deputado Aldo Rebelo em discussão no Congresso Nacional.
A partir desta análise fazemos uma correlação com os índices de violência registrados no campo nos últimos anos, principalmente na região sudeste do Pará, e as possíveis interrelações existentes entre as propostas de alteração na legislação e o acirramento dos conflitos no campo em torno da questão ambiental nesta região de fronteira.
Finalizamos com apresentação de algumas proposições de ações em educação ambiental junto à sociedade local a fim de enfrentar esta nova perspectiva no campo educacional, político e social.
2. BREVE HISTÓRICO DO CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO
Segundo Ellinger & Barreto (2011), a primeira versão do Código Florestal foi a de 1934. Esse código exigia que todas as propriedades mantivessem 25% de sua cobertura vegetal. Depois de várias mudanças, o percentual que passou a vigorar na atualidade foi o de 35% em cerrado na Amazônia Legal, 80% em floresta na Amazônia Legal e, para todo o resto do país, o percentual passou a ser o de 20%.
Nessas condições, as áreas de Reserva Legal na floresta amazônica passaram de 50% para 80% em 1996, através da Medida Provisória 1.511/1996, reeditada 67 vezes e congelada em 2001 pela Emenda Constitucional n. 32 (idem).
Desse modo, ocorreram alterações também nas Áreas de Proteção Permanentes (APPs). Para exemplificar esse caso, os autores citados falam das mudanças no tamanho das APPs provocadas pela lei 7.511/1986, que aumentou a largura das matas ciliares em resposta a enchentes em Santa Catarina. Algum tempo depois esse dispositivo jurídico foi substituído pela lei 7.830/1989, alterando novamente a largura da APP de mata ciliar. No entendimento dos autores citados, o objetivo das mudanças que aumentaram as exigências de preservação ambiental pretendia responder a avanços no conhecimento científico ou evitar desastres.
Na percepção de Ellinger & Barreto (2011), essas medidas de mudanças eram necessárias, no entanto, tornaram ilegais situações que antes eram regulares. Para que o produtor se adequasse as novas regras, foram criados alguns meios e estímulos, como a possibilidade de se reduzir para 50% a Reserva Legal (RL) na Amazônia Legal para fins de recomposição mediante o Zoneamento Econômico Ecológico (ZEE), e a possibilidade de haver o plantio de árvores frutíferas em sistema intercalar ou consórcio com espécies nativas na RL de pequenas propriedades e posses rurais familiares. Porém, essas medidas não foram suficientes para promover a adequação das propriedades ao Código Florestal.
3. AS AMEAÇAS DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL
Na percepção do deputado federal do PSOL Ivan Valente, o novo código florestal traz mudanças significativas que poderão trazer graves consequências para o meio ambiente e criar um caos no campo, acelerando conflitos sociais/ambientais e criando um cenário irreversível de destruição/degradação do meio ambiente.
Dentre as ameaças propostas no novo código florestal temos:
3.1 Redução das áreas de preservação permanentes
3.1.1 . Restrição das áreas definidas como APPS (Áreas de proteção permanentes).
3.1.2 . Redução das matas ciliares.
3.1.3 . Sobreposição de APPS e reservas legais.
3.2 Diminuição da reserva legal
3.2.1 Isenção para propriedades com menos de 4 módulos fiscais
3.2.2 Ampliação das regras de compensação.
Com estas propostas objetiva-se flexibilizar as leis, tornar áreas protegidas em propícias a exploração, como visto na redução das matas ciliares e na restrição de APPs.
Num primeiro cenário o código florestal novo traria uma real possibilidade de exploração em APPs de extrema importância não só para a sustentabilidade dos terrenos de altitudes elevadas, como também pelo fato de protegerem nascentes nestes locais.
Num segundo cenário, segundo Ivan Valente, observa-se uma abertura aos moldes do capitalismo selvagem, na medida em que generaliza as políticas de diminuição da reserva legal dando isenção para propriedades com menos de 04 módulos fiscais, ou seja, cerca de 400 hectares. O correto a nosso ver, seria criar políticas específicas de isenção para pequenos agricultores, agricultura familiar. Logo se desenha um cenário de grande desmatamento e influência na rede hidrográfica e climática irreversível.
Todas estas ações/iniciativas mostram o poder que o grupo relacionado à agricultura empresarial, agronegócio, pecuaristas – a bancada ruralista – tem no congresso nacional, mostrando mais uma vez que a classe política não nos representa, mas tem interesses particulares e representa interesses de classe, na maioria das vezes opostos aos interesses da coletividade.
3.3. Descentralização administrativa ambiental e flexibilização da legislação
Segundo o deputado Ivan Valente, o Relatório Aldo Rebelo propõe outra mudança que prevê dar mais autonomia aos estados e municípios. Tal mudança propõe dar mais poderes para que eles próprios decidam os parâmetros mínimos de proteção e precaução ambiental em seus territórios.
Nesse cenário, o mencionado relatório pode levar a uma “corrida fiscal ambiental” nos estados que ofereçam melhores condições de desmatamento com o alvo de atrair empresas para suas regiões, segundo Valente. Para ele, uma legislação de âmbito estadual também pode se apresentar mais suscetível a pressões políticas e econômicas de segmentos locais, proporcionando enormes prejuízos ao meio ambiente e toda s sociedade.
3.4. Anistia aos desmatadores
De acordo com o deputado citado anteriormente, o relatório do novo Código Florestal, cria o Programa de Regularização Ambiental (PRA), indultando os imóveis que tiveram áreas desmatadas antes de 22 de julho de 2008. Segundo esse relatório, estaria perdoada qualquer derrubada feita antes dessa data, suprimindo também as cobranças de multas que decorreram de transgressões cometidas até esse período. Esse PRA também assegura a manutenção das atividades agropecuárias que se estabeleceram em áreas de APPs e Reservas Legais até a data citada acima.
Nessas condições, o deputado Ivan Valente nos revela que pararam as averbações de terras desde 2008, especialmente desde que a possibilidade de anistia foi anunciada. Segundo ele, o anuncio de tal anistia provocou um aumento no desmatamento no estado do Amazonas, que cresceu três vezes em 2010 em relação a 2009, e, foram paralisadas as políticas públicas de fomento, crédito, assistência técnica e comercialização, que antes eram construídas em diálogos com o governo.
4. Alterações no Código Florestal brasileiro e os riscos para o aquecimento global
Estudos do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada) mostram que a reforma da legislação torna praticamente impossível ao Brasil cumprir suas metas de redução de emissões. Foi estimada a área de vegetação nativa que deixará de ser recuperada nas propriedades rurais de até quatro módulos fiscais caso estas fiquem desobrigadas de serem reflorestadas. Se não houver novos desmatamentos pelo menos 29 milhões de hectares (área semelhante a Itália) de mata nativa deixarão de ser recuperados. Havendo desmatamentos futuros nas áreas isentas de manter as reservas legais, o total de área desmatada pode chegar a 47 milhões de hectares (área semelhante a Espanha). Com isso, deixarão de ser estocadas quantidades entre 17 e 28 vezes a meta brasileira de redução das emissões de gases que aumentam o efeito estufa. O Brasil assumiu o compromisso de reduzir a curva de crescimento de suas emissões de gases estufa entre 36,1% e 38, 9% até 2020 e foi estabelecido na Lei 12.187/2009, que institui a Política Nacional sobre Mudanças Climáticas do Clima e foi também informado à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.
Como a anistia aos desmatadores funciona como incentivo a novas devastações e como a maior parte das emissões brasileiras é proveniente de desmatamentos e alterações no uso da terra, as metas brasileiras não serão cumpridas. Mudar o código florestal neste sentido significa, portanto, desrespeitar as metas assumidas pelo próprio governo federal.
5. A LUTA PELA TERRA, CONFLITOS AGRÁRIOS E VIOLÊNCIA NO CAMPO
A Amazônia é uma região que representa metade do território nacional e que possui gigantescas reservas de recursos naturais renováveis e não renováveis. Por outro lado, é também uma das regiões brasileiras mais conflituosas e violentas, sendo responsável pelo maior número de conflitos acompanhados de crimes que acontecem no campo.
Dentro desse contexto socioeconômico, político e ambiental a região Sudeste do Pará aparece desde 1970, como palco de disputas constantes de espaços para diversos tipos de projetos: agricultura camponesa, pecuária, exploração madeireira, siderurgia, mineração, monocultura de eucalipto e construção de hidrelétricas (Cepasp, 2010).
Na década de 1980 as lutas e conquistas da terra pelos trabalhadores rurais se ampliaram, culminando na criação de mais de 500 projetos de assentamentos até o ano de 2004, quando da queda desta ascensão dos movimentos sociais do campo pela conquista da terra (Idem).
Oliveira (2001:13) destaca que os conflitos e violência no campo não são exclusividade da nossa contemporaneidade. Desde os indígenas essa história vem sendo reproduzida. Segundo o autor, “o número de mortos no campo, vem crescendo e se transformando qualitativamente”. Nesse processo de violência não morre unicamente o posseiro que ocupa a terra, mas também as lideranças sindicais, aqueles que os apóiam e defendem. Os padres, os pastores, os agentes pastorais, os advogados, as freiras, etc.
A CPT (Comissão Pastoral da Terra ligada à Igreja Católica) em um levantamento contabiliza 641 casos de violência no campo, com 918 mortes, em estados da Amazônia legal, de 1985 a abril deste ano. O Pará tem um maior número de vítimas dos conflitos, com 621 pessoas assassinadas. Do total dos casos, apenas 5% foram a julgamento, destes 18 mandantes e 22 executores foram condenados e 17 executores absolvidos.
Somente no Estado do Pará foram registradas 219 mortes no campo nos últimos dez anos. Essas mortes aconteceram em decorrência de conflitos agrários. Nesse mesmo período houve apenas quatro condenações em consequência desses crimes, o que termina fomentando a violência no campo, visto que não há punição para os responsáveis por todos esses crimes praticados na maioria das vezes, com o aval do estado de direito que deixa a desejar na execução das políticas públicas de reforma agrária e de proteção ao meio ambiente natural e social.
Fazendo uma analogia do número de mortes registradas no campo paraense com o número de conflitos, temos nos últimos dez anos, o registro de 266 conflitos que aconteceram em sua grande maioria na região Sudeste do Pará.
Segundo informações divulgadas na Agência Brasil de Brasília (2011), em 37 casos, não houve sequer instauração de inquérito para investigar as mortes ocorridas no campo em decorrência desses conflitos. O Pará está em quarto lugar no ranking de violência no campo brasileiro entre o período de 1985 – 2009, perdendo somente para Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Roraima (Expressão Popular, 2009).
De acordo com o procurador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o senhor José Marques Teixeira, “a forma de apurar os homicídios só milita no sentido de que a impunidade seja sacramentada, ainda que pessoas acusadas de crimes sejam processadas”. O presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, Gercino da Silva Filho, que também é ouvidor agrário nacional, disse que “entre as principais razões para a ocorrência de crimes no campo estão grilagem de terras públicas ou a ocupação ilegal dessas áreas e extração ilegal de madeiras” (Agência Brasil, 2011).
O mapa revela então a violência do latifúndio moderno-colonial e do agronegócio (Expressão Popular, 2010).
Trata-se de uma síntese dramática que revela o caráter extremamente conflituoso e violento do modelo agrário-agrícola em desenvolvimento no Brasil nos últimos 25 anos (1985-2009) e que revela a face oculta do tão decantado agronegócio. Esse é um modo de (re) produção histórico que tem na concentração fundiária e na violência, os dois pilares que estruturam as relações sociais e de poder na sociedade brasileira (p. 109).
De acordo a (CPT, 2010) a onda de violência na região sudeste do Pará está subdividida em cinco períodos históricos:
Entre 1985 e 1990 predominou a violência privada, ou seja, provocada diretamente pelo latifúndio com a mão armada dos pistoleiros de aluguel. O segundo período se deu entre 1991 e 1995 onde aconteceu uma retomada paulatina dos movimentos sociais com o aumento em 38% a média anual de ocupações de terras e de famílias envolvidas nessas ocupações. O terceiro entre 1996 e 2000, onde foram intensificadas as mobilizações em torno da luta pela terra, sendo considerado o período de maior média anual de ocupações e de famílias envolvidas nessas ações. É importante lembrar que foi nesse período que ocorreu o Massacre de Eldorado dos Carajás, no dia 17 de abril de 1996.
No quarto período que aconteceu entre 2001 e 2002, houve um refluxo em todos os indicadores de conflitos e das diferentes formas de violência em relação ao período anterior, no rastro das medidas criminalizadoras dos movimentos sociais na era FHC. Já o quinto período aconteceu entre 2003 e 2009. É o período de maior conflitividade em toda série histórica de 25 anos. Nesse período houve uma retomada do número de assassinatos no campo.
Na região Sudeste do Pará os assassinatos ocorridos nos últimos meses só tem alimentado esse ranking de violência no campo. Por último tivemos o assassinato do casal de ambientalista (José Claudio e Maria do Espírito Santo), assassinados no mesmo dia que estava sendo aprovadas as alterações no código florestal, simplesmente porque eram a favor das florestas.
Diante desse episódio, percebe-se que mesmo o Brasil possuindo, até hoje, uma das mais avançadas legislações ambientais do mundo, na prática essa Lei não foi capaz de defender a vida desse casal de ambientalista, assim como não conseguiu defender também a vida do Chico Mendes no Acre e da Irmã Dorothy em Anapú.
De acordo com o José Batista da CPT (2011) “este novo código florestal anistia os crimes ambientais até 2008, enfraquece as unidades de conservação e de preservação permanente e fortalece o agronegócio e os grandes projetos na região”.
O recuo progressivo dos últimos governos civis na implantação da Reforma Agrária no Brasil tem reforçado os conflitos e a violência no campo. A mudança no código florestal brasileiro faz parte dessa estratégia que anistiar o crime ambiental e social.
Nossa região é quem mais sofrerá com a mudança do código florestal, pois está localizada numa região onde os grandes projetos e o agronegócio avançam contra as florestas e também contra os assentamentos de trabalhadores rurais.
Vejamos agora a ocorrência de assassinatos entre 2010 – 2011 da região sudeste:
VÍTIMAS | DATA | LOCAL | MOTIVOS |
Raimundo Nonato | 01.01.2010 | Novo Repartimento | Conflito Agrário |
Francisca Pereira da Cruz | 17.09.2010 | Pacajá | Conflito Agrário |
Cícero Santiago (Índio) | 18.09.2010 | Pacajá | Conflito Agrário |
José Feitosa da Silva | 18.09.2010 | Pacajá | Conflito Agrário |
PA Cururui -não identificado | 18.09.2010 | Pacajá | Conflito Agrário |
Antonio Moreira da Cruz | 19.09.2010 | Pacajá | Conflito Agrário |
Manoel Martins da Silva | 30.11.2010 | Eldorado dos Carajás | Conflito Agrário |
José Claúdio Ribeiro da Silva | 24.04.2011 | Nova Ipixuna | Conflito Ambiental |
Maria do Espirito Santo da Silva | 24.04.2011 | Nova Ipixuna | Conflito Ambiental |
Eremilton Pereira | 25.04.2011 | Nova Ipixuna | Suposta testemunha de crime |
FONTE: Adaptado de CPT, 2011.
Foram dez assassinatos em menos de dois anos o que evidencia o alto índice de violência no campo na região Sudeste do Pará. Segundo relatório da CPT os movimentos sociais diminuíram as suas ações na luta pela terra e mesmo assim a violência no campo persiste.
O caso de violência mais recente é o de Nova Ipixuna que até o momento está sem solução, assim como tantos outros. A sensação de impunidade na região só tem aumentado a violência no campo. Como exemplo, citamos a última vítima da tabela acima, que tudo indica que foi morta por ter presenciado o crime do casal de ambientalista no Projeto Agroextrativista Praia-Alta Piranheira.
Outra observação que fazemos é com relação ao motivo dos crimes. Desde o Chico Mendes e a Irmã Dorothy, os conflitos ambientais voltam para pauta de discussão com o assassinato do casal de ambientalistas que ganhou destaque na imprensa nacional e internacional.
Esse estudo ficou restrito a região Sudeste, todavia na região Sul do Pará a conjuntura de violência no campo não se dá diferente da nossa região.
6. O CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO E A VIOLÊNCIA NO CAMPO
Qual a interferência do Código Florestal brasileiro e suas mudanças no cenário de violência no campo no Sudeste do Pará? As medidas defendidas pelo relatório do novo código contribuirão para incentivar a violência no campo?
Os deputados Domingos Dutra do PT do Maranhão e Ivan Valente do PSOL de São Paulo, que participaram da comissão geral para discutir a violência no campo, afirmaram que o novo Código Florestal, aprovado no último dia 24 de maio, estimula os assassinatos de lideranças ambientalistas. (Agência Câmara de Notícias)
Para os trabalhadores rurais da região norte, tanto o Código Florestal quanto a falta de reforma agrária incentivam a violência no campo. (Agência Brasil em São Paulo). Dercy Teles de Carvalho Cunha, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri no Acre, afirma que, “a mudança no Código Florestal está incentivando o retorno dessa violência no campo, mas o principal fator é a concentração de terra nas mãos de poucos, em detrimento da maioria”.
Segundo Dom Tomás Balduíno, a flexibilização do novo código desobriga os desmatadores da responsabilidade de recuperar as áreas já devastadas, somado a isso, a permissividade e as anistias trarão como resultado a expansão de gigantescas áreas de monocultura.
A luta dos agricultores familiares rurais por direito ao acesso e permanência na terra e de ambientalistas em defesa da floresta sofrerá um profundo golpe. A disputa dos dois projetos de desenvolvimento na Amazônia, o modelo do agronegócio e a agricultura familiar ficará ainda mais acirrada.
Dados da FAO – Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação, referentes a 2009 em relação à produtividade por hectare, colocam o Brasil na 64ª posição na produção de milho, 72ª no trigo, 37ª no arroz, 48ª na carne e 9ª na soja. Apesar do discurso dos representantes do agronegócio brasileiro ostentar o orgulho de serem competitivos no cenário mundial, esses dados, revelam que o país atrás de outros menos desenvolvidos e que há um grande espaço para o aperfeiçoamento tecnológico da agropecuária no país. No entanto este grupo defende a liberação de áreas cada vez maiores de terra, como podemos considerar neste momento, as alterações propostas pelo projeto de código.
Para Carlos Walter Porto Gonçalves, nos estados onde a expansão dos modernos latifúndios do agronegócio está mais presente (Centro Oeste e Norte) a violência é mais intensa, o agronegócio necessita permanentemente incorporar novas terras, o qual lança mão de todos os mecanismos para alcançar seus objetivos: os de mercado, os políticos e a violência (cadernos da CPT, 2005, p. 185).
Há uma eliminação seletiva das lideranças, como uma forma de desarticular as ações dos movimentos sociais, estes vistos como obstáculo aos grandes projetos degradantes da floresta.
Apesar de a violência estar mais ligada ao problema da disputa por terra na sua maioria, os casos de assassinatos de lideranças ambientais (Chico Mendes, Dorothy Stang e mais recentemente José Cláudio e Maria do Espírito Santo) apontam uma tendência de disputa por um modelo de desenvolvimento onde o meio ambiente é fundamental.
Um cenário de facilitação para o avanço do latifúndio sobre as florestas fortalecerá os setores mais conservadores e colocará a disputa pelos recursos naturais como um elemento central na hegemonia de um modelo predatório, principalmente nestas regiões onde o recurso natural é mais abundante para a expansão do grande capital. Populações indígenas, ribeirinhos, extrativistas e posseiros ficarão mais vulneráveis a pressão do setor madeireiro e do agronegócio.
A discussão de um modelo sustentável ficará mais difícil de prevalecer no debate agrícola e agrário de ocupação no campo brasileiro tendo em vista o desmonte do marco legal para a conservação. Os projetos alternativos de desenvolvimento sustentável como as Reservas Extrativistas dos seringueiros e os PDS (Projetos de Desenvolvimento Sustentável) defendidos por Dorothy Stang ficarão cada vez mais desacreditados pela sociedade local dado o pequeno amparo estatal para a viabilização dos mesmos.
O resultado provável deste movimento será uma criminalização das lideranças ambientalistas, pois as mesmas não estariam contribuindo com o “desenvolvimento da agropecuária brasileira” e consequentemente mais casos de violação dos direitos humanos relacionados à luta ambiental podem ser registrados em um futuro próximo. O próprio relator do projeto deputado Aldo Rebelo em artigo publicado no jornal Folha de São Paulo reclama da expansão das unidades de conservação pelo país e evidencia a preocupação com a competitividade agropecuária do país no comércio internacional, criticando setores ambientalistas nacionais que estariam a serviço de interesses do capital internacional.
O privilégio ao modelo agrícola do monocultivo para exportação a fim de fortalecer as commodities do país no mercado internacional caminha em oposição ao modelo sustentável baseado na agricultura familiar. A agricultura familiar congrega diversos fatores favoráveis ao desenvolvimento sustentável como a mão-de-obra local, fortalecimento dos mercados locais, uso conservacionista dos recursos naturais, diversidade de uso do solo e biodiversidade.
O texto aprovado na Câmara de Deputados enfraquece este modelo na região sudeste do Pará e volta a fortalecer um ciclo vicioso onde o latifúndio se estabelece através do desmatamento para o mercado madeireiro, o uso de mão-de-obra escrava, o avanço do monocultivo e o acirramento da disputa pelo espaço territorial através do conflito pela terra.
O contraponto ao projeto aprovado seria a reforma do Código atual tomando por base a sustentação deste novo modelo agrícola baseado na agricultura familiar e na produção sustentável através de uma normatização que possa garantir a manutenção de nossas florestas e a recuperação das áreas degradadas através de tecnologia. A agricultura familiar deve ser tratada de forma especial por ser aliada neste processo de conservação.
No âmbito do aparato estatal é fundamental a adoção de políticas públicas que estruturem a produção local através do apoio a uma política de reforma agrária de base agroecológica.
No campo da justiça é importantíssimo o fim da impunidade contra os crimes cometidos contra as lideranças rurais com a apuração dos assassinatos e ameaças de morte e prisão dos condenados.
José Claúdio e Maria do Espírito Santo assassinados em Nova Ipixuna em 24 de maio representavam aqueles que viviam da floresta e a defendiam dos interesses predatórios, lutavam por uma convivência integral e integrada ser humano e natureza, exploravam os recursos da floresta sem devastá-la, e por acreditar que era possível esta convivência, denunciavam a extração ilegal de madeira que acontecia no projeto agroextrativista Praialta-piranheira.
Várias atividades econômicas eram desenvolvidas a partir dos frutos da floresta, a produção era diversificada e a produção agrícola em sua grande maioria era para subsistência das famílias, 10 famílias que moram as margens do Rio Tocantins, trabalhavam com peixe e cupu (coleta na floresta e plantio). 07 viviam do extrativismo da castanha-do- pará, andiroba, cupuaçu, babaçu e seus subprodutos e também criam gado. O restante das famílias assentadas trabalha com outras atividades como: carvão, gado, extrativismo de frutos e exploração madeireira.
Depois das mortes do José e Maria, muitas famílias ligadas ao casal afastaram-se do assentamento e de suas atividades. Os assassinos continuam soltos, mas parte da família hoje vive refém do medo.
7. O PAPEL DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A urgente transformação social de que trata a educação ambiental visa à superação das injustiças ambientais, da desigualdade social, da apropriação capitalista e funcionalista da natureza e da própria humanidade. Vivemos processos de exclusão nos quais há uma ampla degradação ambiental socializada com uma maioria submetida, indissociados de uma apropriação privada dos benefícios gerados. Cumpre à educação ambiental fomentar processos que impliquem o aumento do poder das maiorias hoje submetidas, de sua capacidade de autogestão e o fortalecimento de sua resistência à dominação capitalista de sua vida (trabalho) e de seus espaços (ambiente). (Sorrentino, 2005).
Diante deste cenário de violência no campo, associado à luta ambiental, o processo educativo ambiental no sudeste do Pará necessita de uma articulação mais organizada para intervenção.
Entendemos o processo educativo numa dimensão crítica, emancipatória e política, contribuindo para a reconstrução dos saberes coletivos em busca de uma sociedade sustentável. Elegemos como diretrizes para a EA na região como forma de enfrentamento à realidade apresentada:
v Formar coletivos educadores para atuarem no campo da EA crítica.
v Popularizar a EA crítica nos diferentes espaços educativos da sociedade.
v Reivindicar que a EA crítica seja política pública de estado e da sociedade.
A partir dos coletivos educadores acreditamos que se construirá uma rede de reflexões acerca das questões socioambientais na região, envolvendo outros sujeitos sociais que possam contribuir na construção de um projeto de sociedade sustentável.
Esses coletivos terão uma atuação local, regional e pretendendo alcançar o âmbito nacional e possivelmente global a partir da criação de um blog que terá como objetivo principal estabelecer uma rede social de discussão e atuação no campo das questões ambientais.
8. REFERÊNCIAS
Agência Câmara de Notícias. Novo Código Florestal incentiva a violência no campo, dizem deputados. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br>. Acessado em: 13/07/2011.
BALDUINO, T. O Código Florestal e a violência no campo. Disponível em: <http://carosamigos.terra.com.br >. Acessado em: 13/07/2011.
CPT. Conflitos no campo: Brasil 2009. Coordenadores: Antonio Canuto; Cássia Regina da Silva Luz; Isolete Wichinieski. – São Paulo: Expressão Popular, 2010.
CRUZ, E. P. Código Florestal e a falta de reforma agrária incentivam violência no campo, segundo trabalhadores. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br >. Acessado em: 13/07/2011.
DIEGUES, A. C. (Org.). Desmatamento e modos de vida na Amazônia. São Paulo: NUPAUB, 1999.
ELLINGER, P. & BARRETO, P. Código Florestal: como sair do impasse? Disponível em: <http:// www.imazon.org.br >. Acessado em: 06/04/2011.
MAZENOTTI, P. Pará registrou 219 mortes no campo nos últimos dez anos, com apenas quatro condenações. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br >. Acessado em: 13/07/2011.
NETO, R. G. da. C. A mineração no sul e sudeste paraense. Cadernos do CEPASP. Marabá-PA: MST, CPT, MAB, FETAGRI, CEPASP, MTM, Mov. Debate em ação.
_______. Impactos da mineração no sudeste paraense. Cadernos do CEPASP. Marabá-PA: CEPASP, 2010.
OLIVEIRA, A. U. de. A geografia das lutas no campo. 10 ed. São Paulo: Contexto, 2001.-(Repensando a geografia).
PIMENTEL, Carolina. Após mortes no campo,131 ameaçados foram incluídos em programas federais de proteção. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br >. Acessado em: 13/07/2011.
SORRENTINO, M; MENDONÇA, R. T. P; FERRARO JUNIOR, L. A. Educação ambiental como política pública. In: Educação e Pesquisa, v. 31, n. 2, p. 285-299, maio/ago. São Paulo: 2005.
VALENTE, Ivan. Código Florestal: os riscos para o meio ambiente e biodiversidade brasileira.
WWF. “Projeto de reforma do Código Florestal é uma bomba de carbono”. Disponível em: <http://www.wwf.org.br >. Acessado em: 13/07/2011.
* Adaptação de trabalho apresentado na disciplina Teoria e prática da Educação Ambiental Crítica, ministrada pelo professor Marcos Sorrentino, durante Especialização em Educação Ambiental, Cidadania e Desenvolvimento Regional.
* Adaptação de trabalho apresentado na disciplina Teoria e prática da Educação Ambiental Crítica, ministrada pelo professor Marcos Sorrentino, durante Especialização em Educação Ambiental, Cidadania e Desenvolvimento Regional.
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