segunda-feira, 1 de agosto de 2011

EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UM CAMPO EM CONSTRUÇÃO

Raimundo Pereira Moura Martins
 Pedagogo e Pós-Graduando do Curso de Especialização em
Educação Ambiental, Cidadania e Desenvolvimento Regional – UFPA – NEAm.


RESUMO:
           
            Este texto é resultado de um trabalho final da disciplina Teoria e Prática da Educação Ambiental Crítica, desenvolvida sob a docência do Professor Dr. Marcos Sorrentino, da USP, que ministrou esta disciplina no Curso de Especialização em Educação Ambiental, Cidadania e Desenvolvimento Regional, na UFPA, Campus do Município de Marabá, Estado do Pará, no período de 11 a 15 de julho de 2011.
            Trata da Educação Ambiental[1] como um campo em construção, buscando discutir esta temática com base nas aulas dialógicas, desenvolvidas pelo Sorrentino, ocasião que nos proporcionou alguns textos que trata da E.A numa perspectiva crítica e emancipatória e nos coloca o desafio de Construir Coletivos Educadores para incrementar o cardápio da E.A em nossa região sem perder de vista os princípios da sustentabilidade global.
Palavras Chave: Educação Ambiental, Pedagogia da Terra, Coletivo Educador e Sociedade e Natureza.

1. INTRODUÇÃO

            Sempre parcipei do processo educativo como sujeito ativo da política e da sociedade. Este campo de atuação tem sido minha arena mesmo antes de tornar-me educador. Assim como nosso saudoso Paulo Freire (Pedagogia da Autonomia, 1996), “compreendo que a Educação é um ato não só pedagógico, mas, sobretudo, um ato político”.
            Partindo desta compreensão, participei desde “criancinha” de vivências coletivas na igreja católica, no movimento estudantil, no movimento popular de bairros, no Movimento Sem Terra e no Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública do Estado do Pará, visando à construção de uma sociedade mais feliz do que a que nós vivemos hoje.
            Mas ao longo da caminhada fui descobrindo que a educação é uma arena complexa, um espaço social que abriga uma diversidade de práticas culturais trazidas por cada pessoa, motivo pelo qual há as contradições internas e externas.
            Hoje procuro fazer e compreender a educação numa perspectiva socioambiental crítica, onde as relações sociedade-natureza não se separam, pois a sociedade faz parte e depende da natureza para continuar a história humana neste Planeta.
            Por essa razão decidi participar da primeira turma de Especialização em Educação Ambiental, Cidadania e Desenvolvimento Regional, oferecida pela UFPA, Campus de Marabá, através do NEAm (Núcleo de Educação Ambiental) que através de uma parceria entre ICMbio – Vale – UFPA, conseguiu possibilitar esta conquista acadêmica para um maior desenvolvimento científico na região.
            Nesse novo processo de formação acadêmica tenho ressignificado o que entendo por educação. Neste curto espaço de tempo fiz descobertas importantes no sentido de contribuir melhor com o espaço socioambiental onde vivemos, pois desde quando havia feito o Curso de Formação de Educadores Ambientais[2], promovido pelo Centro de Educação Ambiental de Parauapebas (CEAP) em parceria com o NEAm/UFPA, ficava incomodado com a minha falta de atuação nas questões socioambientais.
            A possibilidade de poder continuar a formação neste campo de discussão possibilitou-nos o encontro da teorização da E.A com as questões práticas do nosso contexto socioambiental a nível local, regional e global.

2. O CAMPO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA E EMANCIPATÓRIA

De acordo com o sociólogo polonês Zygmunt Bauman é preciso acreditar no potencial humano para que um outro mundo seja possível, pois somente acreditando no potencial humano, mudaremos o estado de degradação ambiental e social em que estamos inseridos. Para Bauman, o mundo não está funcionando adequadamente e deve ter seus fundamentos revistos para que se reajuste, para que a utopia renasça e com ela a tarefa de reformar o mundo (CULT n.138:14, SD).
Para esse autor a idéia de progresso foi transferida da idéia de melhoria partilhada para a de sobrevivência do indivíduo, e com isso está havendo uma invenção de valores, matando o que há de mais sagrado nas relações sociais que é a solidariedade humana e a tolerância do ser humano com o Planeta Terra.
            O que o autor nos alerta já é visível na sociedade. Nunca na história, agimos tão individualmente como agora! Relacionamo-nos querendo tirar vantagens em tudo e pela troca de bens materiais. A vida no mundo está se transformando num grande labirinto onde não conseguimos achar a saída, por isso preferimos ficar apenas na lamentação e na busca de um sucesso individual que na maioria dos casos termina em ilusão e frustração.
            Sorrentino é outro autor que trata a E.A numa perspectiva crítica e emancipatória. Segundo ele,
Precisamos promover o diálogo empoderador, potencializador das pessoas e grupos sociais na construção de seus sonhos/utopias. Promover bons encontros que ampliem a capacidade de agir e pensar/ compreender a realidade em todas as suas nuances e sutilezas (Revista Novatitude, p.8, SD).
            O autor defende a E.A como pedagogia da complexidade, a qual só é possível através do diálogo entre saberes, cores e sabores. Trata-se de uma pedagogia da complexidade que significa aprendermos com a realidade. Gadotti (2009), contemporâneo de Paulo Freire, também trabalha com a pedagogia da complexidade como possibilidade de construção da E.A Crítica. Ele trabalha ainda com o conceito de Ecopedagogia - que envolve valores ecológicos natural, social e integral - e Pedagogia da Terra - responsável pela sustentabilidade socioambiental do Planeta Terra.
Para o exercício dessa prática pedagógica, tanto Sorrentino quanto Gadotti, defendem a E.A como possibilidade de recuperar o cuidado com aquilo que é de todos, em especial o cuidado com o Planeta onde vivemos. A sociedade precisa limitar o consumo exacerbado dos recursos naturais do Planeta e buscar um novo projeto de desenvolvimento, onde a sociedade e a natureza não sofram mais tantos impactos sociais e ambientais.
A criação de Coletivos Educadores, ou seja, a criação de um grupo de profissionais que se aproximam para superar lacunas e dificuldades, potencializando as qualidades e capacidade de cada instituição, de cada pessoa, para possibilitar processos de educação ambiental permanentes, articulados, continuados e voltado à totalidade de habitantes de um determinado território, é uma das sugestões de Júnior & Sorrentino (2006:60) para a construção de um novo projeto de desenvolvimento social e econômico.
            Nessa mesma perspectiva, também defendemos a necessidade da criação de Coletivos Educadores na região como forma de potencializarmos a E.A como política pública de Estado. No momento estamos no processo de convencimento do grupo para depois partir para a organização e a ação, pois segundo Sorrentino (2006):
Pensar e realizar uma Educação Ambiental adequada às particularidades de cada pessoa e de cada grupo e seus contextos socioambientais, exige que o processo educador potencialize os atores nele envolvidos, promovendo a ampliação de sua conectividade com instituições educadoras-ambientais diversas e o fortalecimento desse processo, possibilitando a sua continuidade (p. 9).
            Assim como os autores citados neste texto, também acreditamos que através do diálogo entre a teoria e a prática, a comunicação e a educação, o pensar, planejar, informar, agir, avaliar e estudar deve buscar fazer conexões para responder aos problemas locais, sem perder de vista os problemas globais que afetam o nosso planeta. Se o que motiva a E.A são as questões socioambientais, essas questões precisam se transformar em diálogos no interior das escolas e nos bairros comunitários, caso contrário a E.A não ganhará força e nem poder de convencimento da sociedade.
            Segundo Gadotti (2009), “os conteúdos curriculares têm que ser significativos para o aluno, e só serão significativos para ele se esses conteúdos forem significativos também para saúde no planeta”. Devem ser significativos para garantir a justiça social e a paz no Planeta Terra (grifos meus).
            Compreendemos ainda que E.A é um campo em construção que precisa ter o seu “cardápio” incrementado pelas vivências e alternativas locais. De acordo com Sorrentino, “precisamos reaprender a fazer organização local para combinar com a organização planetária ou estaremos fadado ao fracasso”, pois a E.A que propomos busca desconstruir o discurso da modernização e recuperar o sentido comunitário, por meio de construção de coletivos educadores ambientais (AmbientalMENTEsustentable, 2010:11).
            Leff (Op. Cit.) é outro autor contemporâneo deste leque de diálogos:
Frente ao processo de globalização, regido pela racionalidade econômica e pelas leis de mercado, está emergindo uma política do lugar, das diferenças, do espaço e do tempo, que centralmente traz os direitos pelas identidades culturais de cada povo e legitima regras mais plurais e democráticas de convivência social. É uma política do ser, que valoriza o significado da utopia como direito de cada comunidade para forjar seu próprio futuro (Idem).
            Mesmo diante de um processo histórico de exclusão e individualismo social, fatores que têm promovidos todos os dias a degradação ambiental em nome do progresso econômico, o autor nos esperança para continuar buscando a utopia como fonte de direito comunitário e de conquista de um futuro que deve ser coletivo e solidário.
            Nesse sentido a E.A não deve ficar presa apenas aos grupos científicos, mas podemos chegar ao todo, melhorando as relações entre as pessoas e o mundo que as cerca. É preciso formar pessoas que saibam e queiram atuar na construção de sociedades sustentáveis, como lembra bem Sorrentino & Nascimento (Op. Cit).
            Como dialogando com os problemas locais podemos dialogar com os problemas globais até chegar ao dialogo com os problemas provocados pelos grandes projetos desenvolvidos em nossa região?
            É obvio que essa questão não terá uma resposta fácil, mas precisamos começar, mesmo sabendo que o aprendizado do diálogo, ou seja, o aprender através do diálogo não é uma prática comum da sociedade, especialmente a nossa, que foi formada a partir da colonização portuguesa onde reinou o domínio do império sobre a colônia e depois dos senhores das terras sobre os escravos, e, mais recentemente, da ditadura sobre a democracia.
            A E.A pode ser considerada hoje o maior desafio do século XXI, pois deve ser responsável pela formação de uma identidade planetária, enfrentadora de crises ambientais. Nessa perspectiva a E.A deve estar disseminada na sociedade, estando disponível e presente no momento em que as diferentes pessoas estejam em seus universos individuais aberto ao diálogo mais profundo, objetivando a consolidação de uma identidade planetária sem anular as especificidades locais e individuais (2010:19).
            Trata-se de uma concepção de educação que precisa ocupar as escolas, os centros comunitários, os sindicatos, e, se possível, as igrejas, pois a degradação/impactos da nossa ação está presente em tudo que fazemos. Diminuir a degradação/impactos no meio ambiente é o mínimo que podemos fazer diante da crise socioambiental globalizada.
            Construir a E.A numa perspectiva crítica e emancipatória é uma necessidade vital do ser humano, por isso deve romper os muros das universidades e ONGs e chegar até a sociedade como tema transversal e interdisciplinar, como tema de formação política, cultural e socioambiental; sobretudo, porque essa E.A que está em construção não acontece somente na escola formal, mas também em outros espaços socioculturais.
            Como exemplo, temos o Zé Claúdio e Dona Maria que foram assassinados porque faziam do seu trabalho uma ação prática de E.A.       Em sua área agroextrativista, localizada no município de Nova Ipixuna, no Pará, o casal desenvolvia técnicas de reaproveitamento dos recursos da floresta, o que terminou incomodando os donos do desenvolvimento que os consideravam pessoas pobres e atrasadas, pessoas que colocavam em risco o desenvolvimento econômico, por isso não mereciam mais viver.
            O mesmo aconteceu com Chico Mendes no Estado do Acre e Irmã Dorothy Stang em Anapu/PA, que assim como o casal de ambientalista, procuravam fazer de suas atuações E.A e por isso também foram mortos, porque o que vale no atual contexto é o desenvolvimento econômico para exportação comercial do minério, da carne bovina, da soja, do etanol e da madeira, motivo pelo qual o Estado de direito tem fechado os olhos para os crimes sociais e ambientais desenvolvidos na Amazônia nos últimos 25 anos.
            Enquanto militantes da política socioambiental, precisamos dialogar com a sociedade essas questões na perspectiva de radicalizar o processo educativo que acontece nas escolas, nas universidades e na vivencia comunitária, construindo assim, uma sociedade sustentável e ambientalmente responsável com o ambiente onde vive. Essa é nossa utopia, essa deve ser também a nossa luta.
 
3. CONCLUSÃO

            Embora a construção da E.A seja uma tarefa complexa e perigosa, visto que busca interferir nas relações sociais e econômicas no Planeta precisamos encará-la como um novo projeto educacional de sociedade.
            É importante que a sociedade compreenda que o mundo está em crise em função de um projeto de desenvolvimento que é degradante e concentrador, e que este projeto não está dando conta de resolver os problemas sociais e ambientais existentes, por isso cabe a própria sociedade a tarefa de construir um novo projeto de sociedade, no caso um Projeto de Desenvolvimento Social e Ambiental Sustentável.
            Este novo projeto deverá ter as suas matrizes fundadas na sustentabilidade ecológica, ambiental e demográfica, como também na sustentabilidade cultural, social e política onde a E.A será o meio para construção de um futuro sustentável para a sociedade, tal como para as demais vidas existentes na Terra. Enfim, um futuro sustentável para o nosso Planeta que é limitado, portanto, precisa ser cuidado.
            Para darmos conta dessa imensa tarefa, propomos a criação do Coletivo Educador da Bacia do Rio Itacaiúnas e Tocantins, o qual contará com Núcleos Educadores das regiões do Araguaia, Marabá, Carajás e Lago do Tucuruí. A idéia é que esses núcleos façam E.A localmente dentro de uma perspectiva global, sendo que cada um desses núcleos estará incrementando um cardápio de E.A no Coletivo Educador que terá uma atuação em toda a região através de seus Núcleos Educadores que serão as células deste Coletivo Educador.

4. REFERENCIAIS BIBLIOGRÁFICOS

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários á prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
GADOTTI, Moacir. Educar para Sustentabilidade: uma contribuição á década da educação para o desenvolvimento sustentável. SP: Ed, L Instituto Paulo Freire, 2009.
REVISTA. ambientalMENTEsustentable. Janeiro-dezembro de 2010. Ano V. Volume I, nº. 9-10.
Revista. CULT. Nº 138. SD.
Revista Novatitude. SD.
SPAZZIANI, Maria de Lurdes. & GONÇALVES, Marlene F. C. Construção do Conhecimento, Comunidades Interpretativas e Currículo. Ministério do Meio Ambiente, DF, Brasília, 2006.


[1] A partir daqui o termo Educação Ambiental será abreviado por E.A
[2] No ano de 2007 realizei o curso de formação de educadores ambientais mais não consegui atuar como educador ambiental por falta de um espaço coletivo de atuação nas questões ambientais.

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